Nos muros do Jaraguá: minha trajetória na Graffiti Art

A Graffiti Art vem ganhando força a cada dia nas grandes mídias, porém é curioso observar que no passado a repressão e a discriminação dessa arte foi intensa. Em contrapartida, no contexto das minhas experiências no distrito Jaraguá posso dizer que “peguei mó boi”. Ainda na época de escola, eu e os meus amigos mal sabíamos o que era o movimento hip hop e já tínhamos as últimas folhas do caderno cheias de desenhos e rabiscos.

Tela em Graffiti Art em exposição no Fofão Rock 'n' Bar.  Foto: acervo Jamal
Tela em Graffiti Art em exposição no Fofão Rock 'n' Bar.
Foto: acervo Jamal
Assim como em toda periferia, sempre tivemos muito evidente em nosso dia-dia a pichação. Até nos arriscamos algumas vezes para ganharmos um pouco de “fama”. Só que, particularmente, eu nunca serviria para ser um nome foda da pichação na quebrada ou no centro de São Paulo. Digo isso porque minha cautela sempre falou mais alto (kkkkk) tanto para subir nos picos altos quanto para enfrentar o enquadro agressivo e racista.

Seja como for, em meio a esse fervor de querer produzir algo, de ter ligação com a arte de alguma maneira, vivia - nos tempos escolares - envolvido com as paradas de criação de cartazes, produção de letras e de outros trabalhos artísticos.

Graffiti Art no Morro Doce, São Paulo. Foto: acervo Jamal
Graffiti Art no Morro Doce, São Paulo.
Foto: acervo Jamal
Lembro como se fosse hoje, eu tinha de 12 para 13 anos (faz teeeempo!) quando comecei a observar os "riscos" quebrada adentro e vi o primeiro "trampo" de respeito que me chamou a atenção. Era uma arte da gang¹ "Deuses", que havia acabado de estourar. Meus olhos brilharam como as luzes de um fliperama. Não demorou muito e os caras fizeram um trampo na minha escola, a Ana Siqueira da Silva, e daí em diante eu sabia exatamente o que queria pra mim.

Mais tarde, acabei conhecendo o movimento hip hop. Fui me informando, estudando sobre, me arriscando com as tintas, riscando muito papel. Um dia apareceu "do nada" uma oficina de Graffiti na escola. "Putzzzzzz! Olha lá os caras pintando com spray sem escorrer!". Minha felicidade foi tanta que hoje entendo a euforia da molecada para apertar o spray nas oficinas que ministro.

Oficina na escola Fontenelle, em Jaraguá. Foto: acervo Jamal
Oficina na escola Fontenelle, em Jaraguá.
Foto: acervo Jamal
Foi por meio dessa oficina ministrada pelos artistas Consp., Guetus e Fofão com o apoio da Comunidade Cultural Quilombaque na escola Ana Siqueira que comecei a ter acesso a eventos e rolês, e também a aprimorar minhas técnicas e tal. E hoje tenho o privilégio de conhecer pessoalmente artistas que antes só conhecia pelos trabalhos deles que saiam em revistas. É muito louco isso!

No decorrer desses anos todos, eu procurei conciliar trabalho, estudo e Graffiti. Pinguei por alguns trabalhos informais. Depois me inteirei com movimentos culturais e editais. Foi quando percebi que era possível trampar com arte. Nesse processo, devo muito à minha esposa Camila pelo apoio que ela me deu quando lhe disse que queria passar o dia todo sujo de tinta, que queria pintar, que queria isso pra mim.

Graffiti Art na Cidade D'Abril, Jaraguá. Foto: acervo Jamal
Graffiti Art na Cidade D'Abril, Jaraguá.
Foto: acervo Jamal
Logo me vi ministrando oficinas em colégios da quebrada como o Fontenelle e CEU Pêra Marmelo, por exemplo, e também fora do distrito. Parti para trabalhos comerciais e um fato curioso é que nesse meio, no Jaraguá, os clientes quase sempre pedem para desenhar o pico. Então Já pintei muito Pico do Jaraguá por aí.
E continuo assim, nessa luta diária. Procuro me atualizar, utilizar novas técnicas, ler muito. E diante de tudo isso, só posso dizer que é muito prazeroso realizar o que gosto.

Vídeo - realizando o que gosto:

Hoje atuo junto ao coletivo Salve Kebrada com a meta de levar essas experiências para as novas gerações.

Enfim, quem quiser saber mais sobre a Grafitti Art, o Jaraguá e o meu trabalho, clique nos links a seguir:
Assim que tiver mais novidades publicarei novos textos sobre a Graffiti Art no Jaraguá aqui no Jaraguá SP Post.

Notas

  1. Usei o termo "gang", pois o graffiti, que teve origem em Nova Iorque, era produzido por gangs.

Sobre o Autor:
Jamal Jamal é grafiteiro, Gestor Cultural formado pela Prefeitura de SP e Arte Educador Cultural pela Ação Educativa.

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